sexta-feira, 25 de abril de 2008

.................PARTE 4


No mundo cá de fora, enquanto a barriga não aparece, fica difícil imaginar a intensidade e a velocidade com que todo este processo está se desenvolvendo em seu interior. Vinte e quatro horas depois de fertilizado, o óvulo começa a se dividir. Inicialmente, em duas células, depois em quatro, oito, 16, e assim por diante. De uma bola de células surgirá, onze semanas depois, um embrião dotado de todos os órgãos, com sexo definido e que já experimenta seus sentidos. A esta altura, nosso herói já tem cerca de três centímetros e pesa 11 gramas. Sua vida, ainda tão curta, já passou por várias etapas importantes. Ele testou os atos reflexos, adquiriu uma linguagem corporal ainda que primitiva e, na nona semana, começou a tarefa de formar o esqueleto. Após a décima-segunda semana, o feto desenvolveu os sentidos da audição, paladar, tato e visão. Assim, ele chupa seus dedinhos, prova o sabor do líquido amniótico, toca a parede do útero materno; puxa o cordão umbilical, percebe a penumbra à sua volta, ouve os batimentos do coração da mãe, os ruídos do seu intestino e a sua voz. Não se sabe ainda de que maneira, mas é certo que também capta as mudanças do estado emocional de quem o está gerando. Avisem a todos, estourem champanhe, distribuam sorrisos e muita alegria, Há bons motivos para comemorar. Afinal, não é a toda hora que acontece um fenômeno maravilhoso, como o início de uma nova existência. No meio da festa, é desnecessário questionar sobre o momento em que ela surge. Se é quando espermatozóide e óvulo se fundem, se é mais tarde quando o feto já pode viver de forma autônoma ou se apenas quando, na hora do parto, metade de seu corpo já está fora do útero da mãe. Concepções filosóficas ou religiosas à parte, aqui só nos cabe enaltecer a vida. E em qualquer instante que ela comece será sempre bem vinda.


UM mundo envolto em carinho, água, pouco barulho, paz, tranqüilidade. De vez em quando, o som de batidas de um coração que está por ali, bem perto, mas não incomoda. Não é preciso fazer qualquer tipo de esforço, pois o alimento vem gentilmente, saciando-o de todas as necessidades. E são muitas necessidades. Afinal, trata-se de uma vida em formação. Cada célula, cada órgão do ser humano estará se desenvolvendo ali, desde o instante em que foi gerado.Passa o tempo. Pouco a pouco, o conforto do feto vai sendo comprometido, pois ele vai crescendo e o espaço ficando pequeno. Por enquanto, porém, ainda há muito que curtir aquele lugar. Vivendo sua vidinha, chupando seus dedinhos para experimentar a sucção, dando seus pontapés para lembrar à mamãe que ele está por ali e tirando suas sonecas, pois, afinal, todo mundo precisa descansar um pouco.E os movimentos vão ficando cada vez mais difíceis. Basta espichar um pouquinho as pernas, que lá está ele cutucando as costelas da mãe. Ela põe a mão sobre seu corpinho, e pede: "meu filhinho, não faça isso com a mamãe". Ah! Esta natureza bendita! Se, daqui a alguns séculos, tudo se transformar, será difícil para nossos descendentes imaginar como uma vida se formava dentro de outra vida. E conviviam juntas durante nove meses! De repente, um empurrão. Outro e mais outro. Uma verdadeira revolução o atinge e o tira daquela paz tão decantada. Céus! O que será que vai acontecer agora? Outras espremidas. Abre-se um canal em sua frente. E ele começa a escorregar, entre espremidas ainda. Num momento, o canal fica mais estreito, escuro, estranho. E lá vai ele para um mundo que ainda não sabe qual é. Será que tudo começa ou termina aqui?Nasceu! A luz pode até ferir seus olhinhos, a temperatura certamente é diferente. Além disso, será preciso fazer esforço, a partir de agora, para respirar e se alimentar. Mas há compensações, e muitas. É bom, é preciso sentir o afago da mamãe e do papai, olhar seu rosto, conhecê-la de perto. Principalmente se lhe dão oportunidade de ficar junto a ela desde osprimeiros minutos do nascimento.Oferecem-lhe um seio, ele suga e de lá sai o mais gostoso dos líquidos. Viva! Uma nova experiência. Tudo isto não é apenas especulação. A medicina e a psicologia já têm algumas certezas sobre o que acontece com o bebê no momento do nascimento. Que é uma incrível e extraordinária passagem, uma vivência importante, disso ninguém tem dúvida. Alguns estudiosos acreditam que o nascimento pode determinar até atitudes e posturas do adulto diante da vida.Algumas afirmações são, de fato, inquestionáveis. O nascimento é um salto, a primeira experiência do bebê em busca da autonomia, e representa uma grande mutação. De uma forma abrupta - se o neném tiver que ser retirado através de uma cesariana ou de um parto mais agressivo - ou mais lenta, se as coisas forem mais naturais, agora vai ser preciso enfrentar um mundo bem diferente. Imenso, desconhecido, em que, no mínimo, os sons e as luzes não lhe chegam mais tão resguardados pelo corpo da mamãe, como até então.É bem verdade que, hoje em dia, muito se tem feito para tentar suavizar o momento do nascimento. No entanto, por mais que se tente, a hora em que o novo ser entra no mundo é, sempre foi e sempre será uma experiência complexa. Mas, não dá para esquecer que é também um acontecimento natural, que faz parte de um todo muito harmônico preparado em milênios pela natureza para que mais uma pessoa chegue ao nosso planeta.Até bem pouco tempo, não se pensava muito na criança, por ocasião do parto, a não ser sob o ponto de vista de sua vitalidade e de seu bem-estar físico. Acreditava-se, por exemplo, que os recém-nascidos não sentiam nada, não ouviam, não viam e, portanto, também não sofriam. Podia-se virá-los de cabeça para baixo, pendurá-los pelos pés, pesá-los numa balança fria, dar-lhes palmadas e o choro que surgia era encarado como uma expressão de sua normalidade e saúde. Nenhuma dessas medidas era tomada por maldade. Tratava-se, simplesmente, de conceitos médicos solidamente estabelecidos e repassados por muitas gerações, que só começaram a cair há pouco tempo.Principalmente quando um obstetra francês, Fréderick Leboyer, resolveu colocar no papel, de maneira incisiva, mas muito poética, o que muita gente já estava sentindo e experimentando a respeito do nascimento. Levando em conta suas próprias experiências vividas quando observava com atenção todo o comportamento da criança ao nascer, Leboyer lançou o livro Nascer Sorrindo, que representou uma verdadeira revolução na forma como os bebês devem ser recebidos ao mundo quando nasciam. "As coisas, na verdade, são muito simples" - ele afirma. Façamos como os amantes. Penumbra. Silêncio. Recolhimento. O tempo pára e assim a criança pode chegar. Antes do nascimento, não existia nem interior, nem exterior, nem frio, nem calor. Ao chegar, cai no mundo dos contrários. Mas se for recebido com suavidade, o bebê nasce como se saísse de um sono feliz.


Mas, o que será da geração que nasceu sorrindo? Terá o nascimento tanta importância? A estas perguntas, responderemos com o imponderável: só o futuro poderá nos confirmar o que já estamos observando. O certo é que é um instante solene, digno, belo, mágico, emocionante. Em um momento, o pequenino ser deixa de ser feto, passa a ser um recém-nascido vivente, um filho, uma pessoa registrada na sociedade, com todos os direitos e deveres dos cidadãos. Que não nos digam que isto não é um marco! Entre um longo antes - a gestação - e um longo depois - a vida aqui fora - uma breve, mas uma maravilhosa e fundamental passagem. Esse caminho, cada bebê percorre à sua maneira. Da mesma forma que cada parto é vivido particularmente, com todas as suas peculiaridades. Sempre, porém, representará um marco - o mais importante da vida - a ser relembrado, comentado e comemorado por todos com um toque muito especial de emoção, de magia.

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